Quando dois amigos que estavam afastados ha algum tempo se reencontram num ano estranho como esse de 2009 parece conspiração do destino. Destino? Se for o destino ele então já sabia que íamos ficar mal e nos juntou novamente. E por que conspiração? Conspiração porque dá uma grande sensação que a reaproximação foi proposital, para que um apoiasse o outro. E uma sensação maior ainda de que quando a amizade é verdadeira alguém deu um pause nas conversas que tínhamos e agora nesses dias apertou o play e tudo voltou ao normal como se durante anos a vida de cada um deles não estivesse em movimento. O movimento existiu e trouxe paixões, desapegos, conquistas profissionais, a rotina, novas sensações, decisões difíceis e velhos hábitos. Durante a ausência as presenças foram pontuais: aniversários, talvez ano novo talvez natal e talvez um fim de semana “SOS preciso de sua amizade”.
Eu que não era fã de praia passei a fazer da praia uma terapia na companhia dessa amiga, a menina que fica brava quando as pessoas dizem que ela é doce, meiga e amiga. Ela quer ser má. E anos antes fazendo terapia com ela nos tempos do vestibular em um estacionamento de supermercado nunca tinha reparado no quanto ela não queria ser vista dessa forma. Eu a compreendo. A vilã sempre é respeitada seja na ficção ou na vida em que levamos. Mas decididamente ela é doce e meiga. Lê Foucalt, discute filosofia, forma futuros cidadãos e é amiga. Se ela fosse vilã teria mandado para o buraco negro xoxana e seu admirador. Mas isso que faz dela doce e paciente. Longa história. Essa é a essência dela. Mesmo que ela queira ser a “menina má.com” ela não é.
Tentamos marcar um cineminha e todas às vezes chove e muito. Da penúltima vez ficamos na praia a tarde toda, pegamos a balsa e... chuva! Uma criancinha na companhia de uma mãe irritada por não ter resposta de insistentes chamadas pelo celular profetizava: mãe, ninguém atender porque eles acham que a gente morreu! E assim voltamos para casa molhados e sem cinema com a sensação de que a criancinha estava correta. Morremos um pouco naquele dia. E a vontade de ir ao cinema foi adiada.
Ontem foi mais ou menos a mesma coisa. Um centro da cidade lotado de guarda-chuvas, poças enormes e uma mudança de planos repentina: plano b? Cinema! E não é que a chuva não deixou? Um Botafogo com ruas alagadas, caminhos desencontrados e filmes começando muitas horas depois. Molhados e rindo da situação fomos comer e papear no Subway. E secamos parte da manga no secador do banheiro e tivemos a brilhante e brega idéia de um emergente chegando a casa molhado querendo em cada cômodo da casa branca de dois andares um desses secadores de banheiro. E esquecemos por algum momento que o cinema ficaria para outro dia.
Sempre quando passo em frente a algum cinema e estou molhado lembro-me da cena do filme “Amores possíveis” e do Benício a espera de uma bela Ferraz que nunca chega. E a chuva cai. Impedindo o encontro. E a chuva impõe outro tipo de programa. E obedecemos caminhando entre poças e ruas prestes a alagar com um guarda-chuva que deveria proteger, mas que na verdade nos molha aos poucos. E andamos abraçados na chuva dividindo o mesmo espaço, o mesmo guarda-chuva e vamos ouvindo os problemas, as dúvidas, as frustrações, os medos e as alegrias das últimas horas. E apesar do peso da roupa molhada chegamos a casa mais leve, pois temos certeza que mesmo que outro pause aconteça em nossas vidas, outro play virá logo logo.
Em tempo:xoxana foi um apelido carinhoso que demos a uma cachorra de rua que encontramos numa tarde de sábado e seu admirador era um catador.... de lixo? Não... um catador de pouca vida.