Friday, December 07, 2007

Culpa dos 30?

Horas longuinhas essas, não? A sensação é que o dia passou super rápido, mas que as horas nem tanto. Essa semana ouvi muito Thom York e a sua "analyse" no longo caminho de volta pra casa. A canção parece iniciada pela metade. Aos 30 anos parece-me que a vida está pela metade. O cd passa uma idéia de desconstrução sonora e aos 30 tenho a sensação de me descontruir quase que diariamente. É voltando pra casa que paro para pensar como foi meu dia, como minha vida está e como eu estou olhando pra ela. É nessa longa volta que grudo os olhos na janela e fico olhando o mesmo caminho todos os dias. O caminho eu já conheço todo. Não há surpresas. Algumas pessoas que ficam paradas em certos pontos de ônibus eu também já as reconheço. Poucas vezes eu durmo. Outras, eu leio. Tenho me observado nos últimos meses e ando mais calado, analisando mais as coisas e as pessoas. De falador a observador. Culpa dos 30? Ando percebendo como me comporto diante dos meus amigos e diante das pessoas que ainda não conheço bem e tem horas que me sinto desconfortável e muitas vezes me faço presente para vencer uma barreira recente de ostracismo que anda me perseguindo. Mudei na forma de falar o que penso. Antes eu tomava coca-cola com limão sem reclamar, agora eu peço pra lavar o copo. Em sampa é o lugar que mais sou testado e é justamente onde eu mais reclamo. Por algum motivo sempre que vou com minha amiga aos lugares baladinhas e que certamente nada poderia dar errado, porém, sempre dá. E repetidamente. É copo fedendo em padaria bacana no Jardins, é mesa mal localizada e de frente pro elenco do Zorra Total (com direito a criança prodígio) numa pizzaria no também Jardins e além disso, da outra vez os filmes que no jornal estão sendo exibidos em uma tal sala na hora descobrimos que é em outra, bem mais longe. Desconfio muito que isso só ocorra na sessão que a gente escolhe, depois alguém corre lá e volta com a placa antiga e solta um: "ufa, eles já foram"! Sempre que leio Clarice eu me descontruo e vivo no mundo dela e quando estou nesse mundo eu ignoro tudo a minha volta e depois eu retorno como se estivesse num sono profundo, onde um sinal de trânsito aqui não faz o menor sentido, onde ficar horas sentado num banco de ônibus para poder chegar em um lugar que chamo de casa não tivesse significado algum. Não entro no mundo de Clarice já a alguns meses, talvez por medo de ter maiores reflexões de tudo, talvez com medo de depois de refletir bastante perceber que minha vida anda sem sentido algum. Ando cumprindo bem meu papel de pessoa organizada, responsável e que os amigos gostam. Será que isso tudo são reflexões dos 30? Certamente nos dias próximos ao fim do ano eu revisitarei as palavras de Clarice. Tal ato me faz mais forte. Algumas vezes mais flexível e me dá uma outra sensação de como a vida é bacana apesar de muita coisa lama que precisamos cumprir.
Na volta, olhando pela janela, às vezes sinto vontade de entrar num ônibus sem destino, o mais longe possível, para que o tempo de vigiar a vida através do vidro seja mais longa e com tempo suficiente para me desconstruir nas paradas e tomar uma coca-cola gelada e sem limão e depois me desconstruir novamente e assim, retomar as palavras de Clarice e deliciar-se com a melodia do Thom York. Talvez o grande barato da vida seja ter os olhos atentos para perceber que o verde de uma maçã pode ser tão interessante quanto observar coisas ditas maiores por outros. E os outros sempre acham os feitos deles maiores. Talvez seja por isso que fique tão cansativo viver. E viver em tempos em que pessoas e lojas de shoppings são mais do mesmo seja mais desistimulante ainda. Talvez seja por isso que o dia fique pesado e a noite deva cumprir o papel de saciar vontades. Talvez o que sua alma precisa é somente de boas músicas, bons livros, um belo céu estrelado e uma boa companhia para servir de testemunha e cúmplice desses bons momentos e como diz Clarice apesar de tudo é preciso viver...
Ah, a imagem que ilustra o texto é a capa do cd solo The eraser - Thom York, consuma-o!